sábado, 24 de novembro de 2007

SONHAR EM PORTUGUÊS.

“O sonho comanda a vida” escrevia António Gedeão num dos seus poemas mais emblemáticos - “Pedra Filosofal”. Acho que o português é um ser por natureza sonhador, e é bom que assim seja porque o sonho pode trazer mais alegria ao presente e sobretudo esperança.
Sonhamos com a riqueza dos países nórdicos, tornou-se moda falar do exemplo Irlandês, mas mantemo-nos na ignorância de que para os alcançar não basta sonhar, são também necessários sacrifícios, muito trabalho, formação e educação.
Não somos ricos e sonhamos em sê-lo, na incerteza dessa possibilidade vamos fingindo que somos o que gostaríamos de ser, num jogo de aparências e ilusões onde não resistimos a impressionar quem se atravessa nas nossas vidas, de mostrar aquilo que não somos aos outros, enganando-nos a nós próprios. Não prescindimos de um bom carro nem do último modelo de telemóvel, se para termos isso tivermos que passar um pouco de fome também não nos importamos muito. O importante é que quem nos rodeia tenha de nós a imagem moderna, que se resume ao sucesso, à genialidade e ao dinheiro. E assim passamos a vida, com a corda na garganta, endividados, a contar os tostões, a cortar no essencial, mas nunca reduzindo no supérfluo. Assim somos nós, assim é Portugal.
Vivemos para um sonho, elegendo governantes que nos alimentam o sonho de um amanhã mais próspero e justo, mas que teimam em não encontrar a fórmula e a coragem para atingir esse fim. Entretanto continuamos a sonhar, queremos ir mais além, temos um plano tecnológico! Queremos ser uma sociedade digital, distribuem-se computadores pelas escolas, informatiza-se a administração pública, agilizam-se os procedimentos, temos o plano “simplex”! Quem nos ouve admira-se de tanta inovação e logo se questiona se não será tudo publicidade ou demagogia.
Hoje em Portugal há duas esperanças, além do futebol, para alavancarem a nossa economia e para manterem o nosso sonho comum de deixarmos de ser a “cauda” da Europa. Refiro-me ao TGV e à Ota, ou Alcochete, ou Portela mais um, entre outras soluções que preocupam a opinião pública. Eu também sonho, o meu sonho é que se invista uma “Ota” ou um “TGV” na educação. Um projecto a longo prazo, com custos no presente e resultados talvez só daqui a algumas décadas. Acredito ser esse o grande investimento a ser feito em Portugal e por Portugal.
Esse é o exemplo da Irlanda.

Diogo Castro

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

POESIA

Nunca Mais

Nunca mais te darei o tempo puro
Que em dias demorados eu teci
Pois o tempo já não regressa a ti
E assim eu não regresso e não procuro
O deus que sem esperança te pedi

Sophia de Mello Breyner Andressen

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

CIVISMO

Penso que é consensual o reconhecimento geral de que existe um défice de civismo entre a população portuguesa. Vou um pouco mais longe e considero mesmo que a falta de civismo é um dos grandes males que afecta transversalmente a nossa sociedade, com consequências nefastas para Portugal tanto a nível social como económico.
A “esperteza saloia” do “chico esperto” é por muitos vista como uma das boas características do português e não são poucos os que evocam de modo elogioso esta “tão nossa” maneira de resolver problemas em situações complicadas, ou muito à portuguesa, “em cima da hora” e com soluções “em cima do joelho” que muitas vezes, e verdade seja dita, também se revelam geniais.
Esta “maneira de ser e de agir” encontra-se bem retratada no nosso imaginário por tantas anedotas que se contam, onde o português tem sempre uma solução simples, prática e eficaz para resolver os problemas mais complicados e descabidos.
Infelizmente e esta é uma opinião minha e muito pessoal, os casos de genialidade são raros, as soluções encontradas sempre muito provisórias e de “vistas curtas”.
O desenrasca está intrinsecamente associado a uma forma muito informal de fazer as coisas, normalmente e quando a acção tem que se enquadrar num determinado quadro legal, este não é tido em conta. Quando a solução pode afectar terceiros, estes não são tidos em conta, e por ai adiante. Desculpamo-nos com falta de dinheiro, com a burocracia pesada e lenta que trava os nossos objectivos, com a falta de tempo e pensa-se muito no próprio “umbigo” e pouco em quem está à nossa volta.
Uma pessoa bem educada é essencialmente alguém que não incomoda os outros. A “esperteza saloia” do “ser” português é incomodativa e está associada à falta de civismo.
O civismo e a falta dele é uma questão de educação, não tem a ver com classes sociais, grau de ensino ou poder económico. Tem a ver com a educação que recebemos, mas também com outro tipo de educação, a educação que damos a nós próprios e que, a meu ver, é tanto ou mais importante que aquela que nos foi transmitida.
Todos nós conhecemos exemplos de falta de civismo. Costumo referir sempre o mesmo caso pois é aquele que me consegue irritar solenemente. Quando estou parado no trânsito, normalmente numa faixa de acesso a uma via rápida, como na CRIL em direcção à Segunda Circular ou à AE de Cascais, noto que a grande maioria dos automobilistas são ordeiros e respeitam a fila que por vezes chega a ter 2 Km e muita paciência… outros condutores há que preferem ultrapassar toda a fila pela esquerda e “enfiarem-se” à “má fila” num intervalo entre dois carros, pedindo de seguida as devidas desculpas com um “levantar de mão”. Costumo dizer que no dia em que espontaneamente isto deixar de acontecer uma mudança de mentalidades estará a acontecer em Portugal.
Há alguns anos numa pequena tertúlia sobre civismo com um grupo de estagiários houve um deles que me contou um fenómeno bastante interessante, que acontece na linha sub-urbana de Sintra, aquela que tanta má fama acumula. Nessas estações, “apinhadas” de gente, as pessoas já sabem pela rotina diária o local exacto onde no cais o comboio vai parar, e onde vão ficar as portas de entrada. Em todas as estações da Linha de Sintra formam-se filas ordeiras, e que já nada têm de espontâneo, no cais de embarque em frente ao local onde as portas vão ficar. Ninguém se atropela nem desrespeita o próximo. Ninguém impôs esta regra, ela surgiu naturalmente e numa atitude cívica que todos respeitam. Observei-a “in loco” na altura, fazendo o percurso de comboio até Sintra em hora de ponta. Porque não acontece isto no metropolitano, ou na Linha de Cascais?
Infelizmente este caso que relato é uma excepção. Exemplos de falta de civismo não faltam, desde a REN que instala cabos de alta tenção sobre habitações, ignorando e desrespeitando os cidadãos e as ordens dos tribunais, como aconteceu recentemente em Sintra na freguesia de Monte Abrão, passando pelas “marquises” ilegais que desvirtuam as fachadas dos prédios de todo o país, indo ao desrespeito pelos professores incapacitados e obrigados a leccionar por juntas médicas que não têm médicos…
Enfim… o civismo é um assunto principal para Portugal, pois por trás dele estão os mais sérios problemas do país e também a solução para muitos deles.

Diogo Castro